sábado, 30 de agosto de 2014

Udesc oferece formação a estrangeiros de países em desenvolvimento

A vida do timorense Domingos Sebastião Guterres mudou completamente em fevereiro de 2013. Aprovado em um rigoroso processo seletivo em seu país, ele viajou mais de 17 mil quilômetros para cursar graduação em Administração Pública em Florianópolis, na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).
A oportunidade surgiu por meio do Programa de Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G), que oferece vagas em universidade brasileiras a estrangeiros de países menos desenvolvidos – e que desde 2003 já trouxe cerca de 60 estudantes à Udesc.

Dizendo-se  tranquilo, Domingos conta que, no início, a adaptação às aulas no Centro de Ciências da Administração e Socioeconômicas (Esag) foi muito difícil, especialmente pela dificuldade com o idioma.
Apesar de o Timor Leste ter sido colônia portuguesa, a barreira da linguagem já era esperada: 36 idiomas diferentes são usados no país, entre eles o indonésio e o tetum (a língua oficial, junto com o português).

Domingos cresceu aprendendo essas três línguas além do midiki, idioma familiar no subdistrito onde cresceu (Venilale, no Distrito de Baucau) no pequeno país do sudoeste asiático.

Para auxiliar na adaptação, como primeiro compromisso ao chegar a Florianópolis, ele e outros 15 conterrâneos fizeram um curso de três meses de língua portuguesa na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Desse grupo, outra estudante, Natalina Mendonça Ribeiro, também se matriculou na Udesc, no curso de Medicina Veterinária, ofertado no Centro de Ciências Agroveterinárias (CAV), em Lages.

Os dois estão no quarto termo e devem retornar ao Timor Leste após concluir a graduação, com o compromisso de aplicar seus conhecimentos para ajudar no desenvolvimento do país natal.

Segundo Domingos, um novo grupo de 84 estudantes timorenses deve chegar ainda este ano a Santa Catarina.

Bolsas de apoio

Para cobrir as despesas no Brasil, muitos estudantes beneficiados pelo PEC-G recebem bolsas de estudos de seus países de origem, como nos casos dos timorenses. O governo brasileiro também dispõe de programas de apoio para estudantes, com base no mérito e na situação socioeconômica.

Mas, segundo a responsável pelo apoio aos estudantes estrangeiros da Udesc, Lorieti Nardelli da Luz, a condição social dos estrangeiros beneficiados pelo convênio costuma variar bastante e nem todos precisam de auxílio.

Aos que precisam, é possível recorrer na Udesc a diferentes bolsas de graduação – auxílio permanência, apoio discente, extensão, pesquisa – além do estágio remunerado.

Neste semestre, Domingos começou a atuar à tarde como bolsista de apoio discente na Pró-Reitoria de Extensão, Cultura e Comunidade (Proex), no mesmo prédio da Udesc Esag, onde estuda de manhã.
Programa federal

Desenvolvido em conjunto pelos ministérios das Relações Exteriores (MRE) e da Educação (MEC), o PEC-G traz anualmente ao Brasil cerca de 500 estudantes estrangeiros, aos quais são oferecidos ingresso facilitado e vagas gratuitas em cursos de graduação de universidades brasileiras.

A maior parte dos estudantes beneficiados é vem de países da América do Sul, da África e da Ásia. A Udesc oferece uma vaga por curso a cada ano – que nem sempre é ocupada – e quase todos os centros de ensino já receberam alunos pelo programa.

Os primeiros estrangeiros chegaram em 2003, do Paraguai, e frequentam ou já frequentaram aulas na universidade estudantes de Honduras, México, Equador, Colômbia, Congo, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe, Angola, Guiné-Bissau e Moçambique, entre outros.

Fonte: http://www.sc.gov.br/index.php/mais-sobre-educacao/9610-udesc-oferece-formacao-a-estrangeiros-de-paises-em-desenvolvimento
Estrangeiros buscam trabalho e qualidade de vida em Santa Catarina 


 Veja mais em: http://ndonline.com.br/florianopolis/noticias/191014-estrangeiros-buscam-trabalho-qualidade-de-vida-santa-catarina.html. 

quinta-feira, 28 de agosto de 2014


EMPRESA DONA DA SADIA E PERDIGÃO É CONDENADA POR TRABALHO ESCRAVO

Jornadas excessivas e contaminação da água estão entre as irregularidades analisadas pela Justiça
Por Redação
A BRF – dona de marcas como Sadia, Perdigão, Batavo e Elegê – foi condenada a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 1 milhão por manter trabalhadores em condições análogas às de escravos em uma fazenda no município de Iporã, no noroeste do Paraná. A decisão foi proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (TRT-9) em julho e divulgada nesta semana pelo Ministério Público do Trabalho (MTP).
A fiscalização teve início em 2012, quando o MTP constatou graves irregularidades trabalhistas nas atividades de reflorestamento realizadas em uma fazenda arrendada pela empresa. De acordo com informações do órgão, os problemas encontrados iam desde jornadas excessivas e condições precárias dos alojamentos até a contaminação da água fornecida aos empregados para consumo.
No processo, a BRF alegou que as atividades eram feitas por uma firma terceirizada, o que a isentaria de qualquer responsabilidade. Porém, a Justiça entendeu que a empresa deveria ser condenada porque também é responsável pela garantia de um ambiente de trabalho saudável. Além do pagamento de indenização, ainda deverá cumprir obrigações, garantindo a higiene, saúde e segurança dos trabalhadores que, direta ou indiretamente, prestem serviços a ela.
Em nota, a BRF afirma que “não tolera qualquer tipo de tratamento inadequado, antiético ou que contrarie as leis vigentes para relações trabalhistas”. Além disso, a empresa informou que já recorreu da decisão. Se confirmada, a indenização será destinada à compra de veículos e equipamentos para o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) utilizar em fiscalizações na zona rural.
FONTE: http://www.revistaforum.com.br/blog/2014/08/empresa-dona-da-sadia-e-perdigao-e-condenada-por-trabalho-escravo/

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Bispo emite documento lamentando manifestações contra imigrantes em Caxias do Sul

Nota oficial do Bispo Dom Alessandro Ruffinoni foi divulgada na última terça-feira, dia 19

Bispo manifestou seu lamento quanto a depoimentos. (Foto: Pastoral dos Migrantes).
Bispo manifestou seu lamento quanto a depoimentos. (Foto: Pastoral dos Migrantes).
As manifestações de quatro caxienses foram dadas durante reportagem veiculada em um programa televisivo com alcance nacional no último domingo, dia 17. De acordo com o Bispo de Caxias do Sul, Dom Alessandro Ruffinoni, os depoimentos colidos pela produção da reportagem, todos negativos, foram preconceituosos e determinados a atingir aos cerca de três mil imigrantes que hoje vivem na cidade gaúcha e região, um público distinto entre haitianos, senegaleses e ganeses.

A nota oficial divulgada pela Diocese na última terça-feira, dia 19, lamenta as posições negativas e reafirma o compromisso da Igreja Católica na Diocese, pelo seu comprometimento e ajuda aos imigrantes que chegaram ao município nos últimos anos e meses. Para Dom Alessandro, é preciso muito cuidado com as declarações ou julgamentos, já que a opinião de alguns não, necessariamente, representa o que pensam milhares de caxienses. "Eu achei oportuno manifestar porque diante do Brasil também parece que nós de Caxias não queremos ser hospitaleiros, não queremos acolher os imigrantes, temos medo das pessoas que vem de fora. Então acho que não é, penso, a atitude do nosso povo de Caxias do Sul", completou Ruffinoni. 

Fonte: http://redesul.am.br/N/G/152258
Acompanhe, em áudio, matéria do repórter Tales Armiliato falando sobre a nota oficial divulgada pela Diocese de Caxias do Sul na terça-feira, dia 19.
por Tales Giovani Armiliato , dia 20/08/2014 às 09:58

CAMINHO DO IMIGRANTE

“Não fui eu quem escolheu Passo Fundo, foi Passo Fundo que me escolheu” imigrante do Senegal, Mamour Ndiaye encontrou no município gaúcho a esperança de uma vida melhor.
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.“Eu vim sem dinheiro, com 37 reais no bolso.”
Mamour Badiane Ndiaye, de 35 anos, há cinco encontrou em Passo Fundo oportunidade de emprego e de uma vida melhor. Mas vida de imigrante não é fácil, a prática iniciou em 1530 com a vinda dos portugueses ao Brasil e não parou de se intensificar. No caminho do imigrante a vida é imprevisível. “Tive dinheiro para pagar duas diárias em um hotel, era 15 reais a diária.” Mas, quando o dinheiro acabou, foram quinze dias dormindo nos bancos da rodoviária de Passo Fundo. “Eu tenho mão, eu tenho cabeça, eu prefiro lutar. Prefiro dormir duas, três ou quinze noites na rodoviária e de manhã cedo eu entro nos banheiros, lavo a cara e vou atrás de trabalho. Quem procura acha. Se você quer ir pra frente, você vai mesmo. Você não depende de braço de um ou de outro.” E assim, o senegalês seguiu, até juntar dinheiro para poder voltar ao hotel.
Mamour Ndiaye é um entre as centenas de imigrantes senegaleses que Passo Fundo acolhe atualmente. Desde 2009 na cidade, ele já conseguiu melhorar de vida, hoje é comerciante, vende esculturas em madeira, vindas da África, e gerencia uma lan house, lugar em que “seu povo”, como costuma tratar os conterrâneos do Senegal, mantêm o contato com a família.
Passo Fundo, porém, não estava nos planos de Mamour. Depois de pouco mais de um ano viajando e procurando um lugar ao sol, quando estava na Argentina, ouviu falar da terra do Teixeirinha. Num primeiro momento, ouviu dos hermanos que a documentação no município era obtida com mais rapidez e quando chegou aqui, além dos documentos encontrou emprego e esperança. “Eu cheguei aqui com Deus e foi Deus quem me ajudou”. Na época, vigorava no Brasil a Lei da Anistia e através dela o senegalês pediu sua permanência no Brasil. Chegou falando três línguas oficiais – inglês, francês e espanhol – e mais os dialetos africanos; hoje, já domina o português e ajuda os conterrâneos que continuam chegando na cidade, a conseguirem emprego e documentos.
Do Senegal ao Brasil1
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“Fiquei sem comer nada, durante muito tempo, mas o estômago não fala. Quem de vocês pode falar se eu tomei café hoje de manhã?” questiona, desafiador. Quando saiu do Senegal, Mamour buscava conhecer outra cultura e melhorar a vida para poder ajudar a mãe e os irmãos que ficaram no país, mas não foi fácil. “A imigração é uma opção. É difícil. Você tem que saber aguentar. A imigração é uma universidade da vida. Você aprende a viver.” Apesar da realidade do Senegal e do Brasil ser diferente, se adaptar a uma nova cultura é fácil: o difícil é as pessoas da cidade se adaptarem ao novo, ao povo senegalês. “O que estamos fazendo hoje aqui em Passo Fundo é aprender, estamos tentando mostrar ao povo passo-fundense que nós, também, podemos” diz o comerciante.
Foto: Giseli Furlani (Nexjor FAC/UPF)Quando morava no Senegal, Mamour trabalhava como marceneiro, em Passo Fundo já foi carpinteiro, construtor e feirante, até montar sua loja. A ligação com a cidade hoje, não é apenas de gratidão – ele tem uma filha de três anos, Mere Soda Ndiaye, que é passo-fundense. “Ela é brasileira, tem passaporte brasileiro” comenta. Além dele e da filha, sua mulher, Khady Diown também está em Passo Fundo, e é uma das duas mulheres senegalesas na cidade – chegou aqui seis meses depois do marido.
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“Os negros tem que se manterem fortes”
Martin Luther King, Barack Obama, Nelson Mandela, Joaquim Barbosa, Bob Marley, Pelé. Todos negros. Para Mamour, os homens mais sábios do mundo são negros e as pessoas tentam não enxergar. Embora o senegalês diga que Passo Fundo seja uma boa cidade para morar, sofre com o preconceito todos os dias. “A raça branca acha que é superior à raça negra, mas não é. Deus sabe que não é. Vocês podem me falar que sabem que não são superiores, mas eu não sei o que passa no seu coração. Eu não posso julgar, ninguém pode julgar” desabafa, referindo-se ao ainda difícil relacionamento com a população passo-fundense.
Segundo ele, cerca de 300 senegaleses vivem na cidade. O número pode não ser percebido no dia-a-dia, porque muitos se locomovem apenas do trabalho para casa. E quando o preconceito os assombra, chorar é uma das formas para aguentar e continuar no rumo dos seus sonhos de uma vida melhor. O senegalês lamenta que enquanto o pensamento dominante não muda “o mundo estará terminantemente em guerra”. Ele não fala por falar: tem exemplos. “Há alguns dias eu entrei em uma pizzaria e o vigilante não queria me deixar entrar. Era uma pizza que valia 48 reais e ele achou que eu não poderia pagar. Eu estava vestido de africano, porque não tenho complexo disso, não tenho problema em usar as roupas africanas, se eu me sinto bem com essa roupa, eu vou usar essa roupa. Se fosse qualquer branco entrando na pizzaria, eles abririam a porta e o atenderiam, para mim, eles pediram ‘o que eu queria’. O que se quer quando se vai a uma pizzaria?”
Mamour, no entanto, não cogitou processar o restaurante. “Eu conheço os meus deveres e os meus direitos. Eu sou um homem livre, tenho liberdade, eu não sou um escravo. Os negros tem que se manterem fortes” declara.
Em cinco anos, Mamour voltou duas vezes ao Senegal, e o que arrecada no Brasil, divide com a família e amigos que veem nele uma forma de esperança. “Deus sempre escolhe o melhor para a gente” afirma o imigrante que, mesmo longe 6,264 km da terra natal, acredita que Passo Fundo possa continuar mudando a sua vida e a de muitos senegaleses que ainda estão por vir.
Fonte: http://www.upf.br/nexjor/?p=30825

segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Os novos imigrantes sob a ameaça dos coiotes

Traficantes de pessoas chegam a cobrar US$ 2 mil para trazer haitianos, que também sofrem extorsão de policiais e taxistas no Peru e na Bolívia. Rede de corrupção inclui venda de vistos e outros documentos falsificados


Os novos imigrantes sob a ameaça dos coiotes Diego Vara/Agencia RBS
"Por sorte, eu tinha dinheiro, mas muitos haitianos que ficam na mesma situação são obrigados a passar fome", diz RoldyFoto: Diego Vara / Agencia RBS
Falar com os novs migrantes radicados no Rio Grande do Sul (personagens de reportagem especial publicada na ZH deste domingo) também é colher testemunhos de um martírio. Quase todos penaram no caminho até o Brasil, sobretudo os que ingressaram pelo Acre, na fronteira com o Peru. São frequentes os relatos de extorsão por parte de coiotes – traficantes de seres humanos – e da polícia estrangeira, além de casos de estupro.
Wilkenson Samsom, 19 anos, vive com o pai em Encantado. Ambos trabalham em frigorífico da Dália Alimentos. Para realizar o sonho da vida melhor, o jovem teve de pagar US$ 300 a coiotes e policiais peruanos. Situação semelhante ocorreu com Roldy Julien, 25 anos, presidente da Associação Haitiana de Encantado. Ele fez a rota da maioria dos seus compatriotas: foi até Quito, no Equador, e lá tomou um ônibus que atravessou parte do país, ingressou no Peru e chegou até a fronteira do Brasil, entrando pelo Acre.
No Peru, com quatro amigos, foi extorquido duas vezes. Na primeira, o quarteto teve de pegar 500 sóis (moeda peruana) e mais US$ 300. Receberam um salvo-conduto. Dias depois, perto do Brasil, foram abordados novamente. Veio a notícia de que o papel que tinham em mãos já não valia mais. Dessa vez, Julien foi forçado a pagar sozinho a quantia de US$ 200. Seu passaporte ainda ficou apreendido por uma semana, tempo em que ele precisou se desdobrar com o dinheiro que lhe restava para garantir teto e comida.
— Não sei se tem ladrão no Peru. Mas parece que a polícia é pior — desabafa Julien, que, no Rio Grande do Sul, perdeu três dedos da mão direita em um acidente de trabalho.
Os relatos se repetem desde 2010, quando explodiu a nova imigração para o Brasil. Em maio de 2011, 20 haitianos recorreram à Polícia Federal em Tabatinga (AM), denunciando um compatriota deles chamado Repert Julien, 28 anos, que teria descumprido promessa de hospedagem paga por eles. Em 5 de julho daquele ano, os federais prenderam Julien, que cobrava até US$ 2 mil para trazer haitianos do Peru ao Brasil. Foi o primeiro inquérito de uma série.
No Acre, foi preso em abril de 2013 o jogador de futebol haitiano Innocent Olibrice, quando tentava embarcar no aeroporto de Rio Branco um garoto de 13 anos, haitiano, para Macapá (AP). Innocent, que atuava num time acreano e foi solto cinco dias depois, responde a processo judicial por tráfico de pessoas e estelionato. De acordo com as investigações da PF, o atleta está envolvido numa rede de coiotes. Ele foi contratado pela família do menino para encaminhá-lo à Guiana Francesa ao custo de 500 euros (o equivalente a cerca de R$ 1,5 mil).
Innocent negou a acusação, mas é processado. A pena para o tráfico é de um a três anos de reclusão e expulsão do país. A socióloga Letícia Mamed entrevistou dezenas de migrantes no Acre e constatou: a fuga em razão da falta de trabalho, educação, saúde, habitação e segurança no seu país de origem impulsiona a migração. No Haiti, por exemplo, parece ter se estruturado um negócio com despachantes, falsificadores, aliciadores e coiotes no processo de agenciamento. Relatos também informam existir naquele país a venda de vistos e outros documentos falsificados, inclusive supostas facilidades que prometem acelerar a viagem. Algo que aumentou após o terremoto de 2010.
Na viagem ao Brasil, os haitianos pagam entre US$ 2 mil e US$ 5 mil (valor semelhante ao cobrado de ganeses entrevistados por ZH em Criciúma e em Caxias do Sul). E são vítimas frequentes de extorsões praticadas por policiais e taxistas, sobretudo peruanos e bolivianos. Letícia estima que, de 2010 a 2014, os haitianos já teriam gasto cerca de R$ 6 bilhões em pagamentos à rede de tráfico e corrupção estruturada para chegar ao Acre.
E não só haitianos. Em torno de 16 diferentes nacionalidades já passaram pelo acampamento montado pelas autoridades acreanas na fronteira com o Peru. Todos mostram receio em falar sobre os contatos, a organização do percurso, os agentes contratados e a realização da viagem em si. E quando decidem falar sobre o assunto, geralmente as explicações são pactuadas pelo grupo antes da exposição ao interlocutor.

Empresas agilizam os vistos e arranjam emprego aos migrantes
A vigorosa migração de africanos e centro-americanos para o Brasil tem rendido lucros a dois tipos de empresas: as que se especializam em legalizar a situação dos imigrantes e as que prometem colocá-los no mercado de trabalho. O primeiro serviço é o mais urgente – sem ele, o forasteiro fica clandestino. O segundo é necessário para viabilizar financeiramente a permanência do estrangeiro no país. Esse tipo de intermediação é permitido pela lei.
Em Criciúma, maior polo de atração de ganeses para o Brasil, Zero Hora recebeu a informação de que uma das empresas que legaliza a situação de estrangeiros é a Fullvisa, de Brasília. O site da firma anuncia alguns dos serviços oferecidos: visto temporário para quem tem trabalho no Brasil, transformação do visto temporário em permanente, solicitação de permanência definitiva com base em casamento com brasileira (o). No item Nossa Visão, a Fullvisa não esconde a meta: “Atingir a liderança no mercado nacional de imigração de estrangeiros”.
Como a Fullvisa se localiza em Brasília, torna-se mais fácil e ágil a entrada, acompanhamento e eventuais visitas aos órgãos responsáveis pela análise dos pedidos de visto, uma vez que estes se encontram na Capital Federal – justifica a empresa, que atua há 10 anos.
Proprietário da Fullvisa, o administrador de empresas Charliston Ferreira admite que seu ganha-pão é a legalização de estrangeiros, mas nega que priorize a nova onda de migrantes africanos e centro-americanos. Trabalha mais com auxílio a empresas europeias e americanas que pretendem trazer seus funcionários para o Brasil, para pequenas ou grandes temporadas.
– Agimos como despachantes especializados em estrangeiros. Atuamos em processos administrativos junto ao Ministério do Trabalho, requisições de visto à Polícia Federal. Conseguimos legalizar a situação de algumas centenas por ano – diz Charliston, que aprendeu o ofício nos EUA.
Agência ganha a cada empregado
Outra empresa que atua na legalização de estrangeiros é a Overseas, com sede em São Paulo. O foco é em grandes empresas multinacionais que precisam estabilizar a vida de seus funcionários estrangeiros no Brasil, mas também legaliza novos migrantes caribenhos e africanos. Há poucos dias, a Overseas conseguiu agilizar vistos para 20 haitianos que atuam num supermercado e em duas firmas de construção civil. Foi contratada pelas empresas, não pelos migrantes.
– Prestamos consultoria, ensinamos os caminhos mais ágeis – resume Mateus Valério, gerente da Overseas.
Nem ele, nem o dono da Fullvisa revelam valores cobrados.
Fábrica de móveis contrata migrantes via agência que atua há 21 anos na Serra. Foto: Diego Vara, Agência RBS

O passo seguinte, para o migrante, é conseguir serviço. É aí que entram empresas como a Talentum, agência de empregos que atua há 21 anos na região serrana do Rio Grande do Sul. No ano passado, eles arranjaram serviço para 80 migrantes africanos e caribenhos. Foram trabalhar em indústrias de sucos, de móveis, autopeças e limpeza. O recrutamento e seleção exige que pelo menos um do grupo de migrantes fale português ou espanhol. Ele será o guia dos demais nas negociações de trabalho. E qual o ganho da Talentum?
– Cobramos do empresário que vai dar emprego aos migrantes 50% do primeiro salário de cada um dos novos empregados. É uma taxa padrão – informa Ricardo Soldatelli Borges, proprietário da Talentum, que é psicólogo e ajuda a fazer a triagem. – O valor não é deduzido dos contracheques.
Borges se orgulha dessa atividade e diz que desconhece reclamações quanto à qualidade do serviço prestado pelos migrantes:
– Com a presença dos estrangeiros, diminuíram as queixas quanto a faltas ao serviço e empregados doentes.
Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/08/os-novos-imigrantes-sob-a-ameaca-dos-coiotes-4577705.html

sábado, 16 de agosto de 2014

Os novos imigrantes no RS


As crises e recentes restrições para entrar nos Estados Unidos e Europa tornaram o Brasil em um novo destino para os migrantes africanos, caribenhos e asiáticos que buscam uma vida melhor. A maioria deles entra no Brasil de forma ilegal e, depois, faz o pedido de refúgio alegando questões humanitárias ou perseguições em seu país de origem.  Os novos migrantes, em maioria, são do Haiti, Senegal, Bangladesh, Gana, República Dominicana e Angola. No Brasil, os principais destinos dos novos migrantes são Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Confira as histórias dos estrangeiros que vivem no Rio Grande do Sul.


Assista o video, acesse o link:

Fonte: http://videos.clicrbs.com.br/rs/zerohora/video/geral/2014/08/novos-imigrantes/91537/

Um lugar ao sol, no Sul

Novos imigrantes mudam o cenário do Rio Grande do Sul

Nova migração é um movimento recente, mas suficientemente forte para causar modificações econômicas, étnicas e culturais

Novos imigrantes mudam o cenário do Rio Grande do Sul Mauro Vieira/Agencia RBS
No Brasil, imigrantes podem ganhar até seis vezes maisFoto: Mauro Vieira / Agencia RBS
Um novo processo migratório, formado sobretudo por africanos e caribenhos, começa a vingar no Rio Grande do Sul – onde imigrantes italianos, alemães e poloneses se instalaram aos milhares no século 19. Muitas daquelas famílias europeias se fixaram em matagais despovoados na Serra, no Vale do Taquari e no Norte, dando início às principais colonizações do Estado.
As regiões cresceram, cidades como Caxias do Sul, Lajeado e Passo Fundo se tornaram pujantes polos industriais e hoje são ponta de lança do ciclo encabeçado por 11,5 mil estrangeiros negros – vindos não de zonas rurais, como seus antecessores, mas do meio urbano, e com pelo menos o Ensino Médio no currículo escolar. 

Fogem da pobreza: no Brasil, podem ganhar até seis vezes mais do que no seu país de origem. O território gaúcho é um dos principais destinos de senegaleses e haitianos, principalmente o Interior, pois em Porto Alegre o custo de vida é mais alto, e a demanda por essa mão de obra, menor. Nas pequenas cidades, eles mudam o retrato da massa trabalhadora. Em Encantado, fundada por italianos, os migrantes negros já representam 2% da população – e 30% dos funcionários de um frigorífico da Dália Alimentos.
O sonho de todos é o mesmo dos colonos que chegaram há quase 200 anos: conseguir um lugar ao sol. Produzir. Vencer no Brasil.

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François Petit Compere, 27 anos, já se considera um vencedor. Saiu do Haiti de avião há três nos e cinco meses, rumo a Manaus. Passou horrores na jornada, dormiu ao relento, migrou para Bento Gonçalves, conseguiu emprego e hoje se diz “rico” para os padrões de seu país. Recebe R$ 1,2 mil de salário na metalúrgica Zen e, por trabalhar com polimento, mais 40% de insalubridade. Gasta R$ 300 com aluguel, almoça no bandejão da empresa e a maior parte do dinheiro restante manda para Porto Príncipe, onde sustenta o filho pequeno e a ex-mulher.

— A cada dois meses recebo, praticamente, o que levava um ano para conseguir no Haiti, como cabeleireiro — comemora François, que já trouxe a nova mulher, haitiana, para morar na Serra.

  
François ganha seis vezes mais do que recebia no Haiti
FOTO: DIEGO VARA

Alcançar o status de haitianos como François é o anseio dos ganeses, que começam a chegar em caravanas ao Brasil. Vincent Iaboa , 24 anos, partiu no início de julho de Kumane, no interior de Gana, onde atuava como vendedor ambulante. Juntou dinheiro seu e de um irmão para pagar a viagem, via Marrocos, até São Paulo. Pernoitou na rodoviária paulistana durante 15 dias. Quatro amigos que vieram com ele não aguentaram o barulho dos ônibus e desistiram, voltando. Iaboa era universitário, estudante de Administração de Empresas, mas aqui está disposto a fazer qualquer coisa para sobreviver. Dorme num colchonete dentro do Seminário Nossa Senhora Aparecida, em Caxias do Sul, alimentado pela caridade alheia.

ZH visitou as principais cidades gaúchas onde se concentram os novos imigrantes: Caxias, Bento Gonçalves, Lajeado, Encantado, Marau, Passo Fundo, Erechim e Gravataí. Autores do livro O Novo Rosto das Imigrações no Brasil: O Caso dos Haitianos no RS (a ser lançado em setembro), o pesquisador Jurandir Zamberlam e o padre João Marcos Cimadon, coordenador de Mobilidade Humana da Regional Sul da CNBB, estimam que 11,5 mil africanos, caribenhos e asiáticos se fixaram no Estado.
Porto Alegre é só ponto de passagem, diz Zamberlam, por conta de três fatores: o custo de vida, puxado pelo aluguel, é muito alto; estão no Interior as empresas de abate de animais e construção civil que mais precisam de mão de obra; e, lá, eles não são “invisíveis” como na Capital.

Os haitianos, dominicanos, senegaleses, ganeses, gambianos e bengaleses (habitantes de Bangladesh) e indianos que vieram para cá são de uma certaclasse média urbana. Muitos têm Ensino Médio, Superior incompleto ou mesmo completo. Mulheres, como a senegalesa Adama Sall , 35 anos, funcionária do frigorífico Aurora, de Erechim. 

Parte significativa é poliglota. No caso do Haiti, há pesquisadores que já classificam o fenômeno como uma “fuga de cérebros” do país. Nesse ponto, se diferenciam dos alemães e italianos vindos no século 19, na maioria agricultores com baixa instrução. Somente em grupos mais recentes vieram haitianos de menor escolaridade e mais pobres, ligados ao êxodo rural.
— As imigrações do século 19 foram fomentadas pelos governos. Havia uma política de trazer esses europeus para cumprir três objetivos básicos: povoar o Sul do Brasil, produzir alimentos em pequenas propriedades de terra e, em menor escala, promover um branqueamento da população em função da escravidão — diz o historiador René Gertz, professor da PUCRS.

A maioria dos novos imigrantes vem por conta própria, ingressando de forma ilegal. Depois fazem o pedido de refúgio, instrumento legal para um estrangeiro permanecer no Brasil, alegando perseguições políticas (caso deBangladesh e de Gâmbia) ou questões
humanitárias (caso do Haiti, empobrecido mesmo antes do terremoto que o devastou, em janeiro de 2010). Mas o maior motivo das migrações é econômico, sobretudo em relação a Gana, Senegal e República Dominicana: seus habitantes querem é fugir da falta de trabalho e de dinheiro.

Após a solicitação, o migrante ganha direito de tirar a carteira de trabalho e, assim, ficar temporariamente no país. Em 2013, o número de pedidos quadruplicou, de 4,2 mil para 17,9 mil.

— Eu não chamaria isso de nova onda migratória. Onda pressupõe que, em algum momento, vai acabar. Diria que é um fluxo migratório que passa a incluir o Brasil – pontua Gabriela Mezzanotti, coordenadora do curso de Relações Internacionais da Unisinos.

— Esses fluxos sempre aconteceram, mas o Brasil era exportador, e não destino. Os brasileiros iam aos EUA. Agora estamos fazendo parte desses países que têm algo a oferecer aos migrantes.

Enquanto América do Norte e Europa, premiadas por altas taxas de desemprego, fecham suas fronteiras, o Brasil vem se tornando referência internacional na acolhida. Não existe um programa oficial de incentivo do governo, mas a permanência é facilitada porque o mercado tem interesse na mão de obra.
— Há uma flexibilização da justificativa para o refúgio — diz diz Mariana Dalana Corbellini, subcoordenadora do curso de Relações Internacionais da Universidade de Santa Cruz do Sul. 

— O Brasil considera um dever estabelecer cooperação em termos diplomáticos, fazendo intercâmbio com países em desenvolvimento. São brasileiras algumas das grandes construtoras que atuam na África e América Central, por exemplo. No caso haitiano, o Brasil envia milhares de vacinas ao ano pela Fundação Oswaldo Cruz, oferece cursos pelo Senai e Senac e é líder da Missão de Paz da ONU naquele território, o que lhe confere ainda mais responsabilidade frente aos cidadãos.

Ao mesmo tempo em que dá atenção especial a investimentos no Caribe e na África, o Brasil, com a força de sua indústria, acaba se tornando atrativo para os estrangeiros. O pesquisador Zamberlam exemplifica:

— Hoje, o Brasil é o maior exportador de frango para o mundo muçulmano, com 1,8 bilhão de habitantes atendidos por 300 empresas, a maioria delas da Região Sul. E os muçulmanos só admitem receber o produto se o abate for dentro do rito halal (nos preceitos da religião). Isso contribuiu para que milhares de africanos viessem trabalhar aqui.

Por vezes, as próprias empresas atraem a mão de obra estrangeira. A operação costuma se dar dentro da legalidade. Os refugiados têm carteira assinada e recebem as mesmas remunerações e benefícios dos brasileiros. Mas existem relatos de exploração. Alguns precisam quitar as dívidas contraídas com a viagem, o que os expõem a uma condição de fragilidade e análoga à escravidão: servidão por dívida, jornadas exaustivas, trabalho forçado e meios degradantes.

Em junho de 2013, em Cuiabá (MT), fiscais do Ministério Público do Trabalho (MPT)encontraram, em obras do programa Minha Casa Minha Vida, 21 haitianos alojados em situação precária. Em novembro do mesmo ano, em uma mineradora de Conceição do Mato Dentro (MG), havia, segundo definição do MPT, 100 haitianos “abrigados em local
similar a uma senzala
”.

A primeira coisa que os estrangeiros fazem, após conseguir serviço, é mandar dinheiro aos que ficaram no seu país. É por isso que as remessas dos imigrantes superam as exportações haitianas, informa Letícia Mamed, doutoranda em Sociologia pela Universidade
Estadual de Campinas e professora da Universidade Federal do Acre, que integra um grupo de estudo de migrações. Mais de um terço da população adulta do Haiti recebe repasses monetários regulares de parentes radicados no Exterior. Foram US$ 1,5 bilhão em 2010 e US$ 2,1 bilhões em 2011.

A escassez de força de trabalho nas indústrias do interior gaúcho foi determinante para que empresários buscassem migrantes. Sem eles, as linhas de produção corriam o risco de parar, efeito do desinteresse da população local – focada em melhores empregos – em  desempenhar atividades pesadas e menos rentáveis.

— Enfrentávamos uma carência enorme de mão de obra. Ficamos sabendo que a Massas Romena (em Gravataí) havia contratado haitianos. Fomos até Brasileia (no Acre) e trouxemos 50 haitianos em outubro de 2012 — conta Sandra Simonis Lucca, supervisora
de Pessoal da Dália Alimentos, em Encantado. 

—  Em fevereiro de 2013, voltamos a Brasileia e trouxemos mais 75 haitianos e alguns dominicanos. A partir daí, eles começaram a fazer contatos com outros compatriotas, que foram se candidatando a vagas de emprego. Atualmente, a empresa conta com 321 estrangeiros no frigorífico de Encantado — 30% do total de funcionários.

Após a chegada de milhares de estrangeiros, as vagas de emprego no interior diminuíram. O indiano Prem Abhilash Kapil, 55 anos, sentiu na pele o efeito. Ele veio ao Brasil por indicação de amigos, mas passou cinco meses desempregado. Depois de muita insistência, há pouco mais de 30 dias foi admitido em uma obra da construtora Zagonel, em Lajeado, onde vive em uma casa com outros três compatriotas. Está mais aliviado.

— O Brasil é bom para ganhar dinheiro. Estou feliz, meu único problema é a língua — diz Kapil, que tenta, muitas vezes em vão, se comunicar em inglês com a população do Vale do Taquari.

Com a desaceleração da indústria, a expectativa dos setores produtivos é de que, em breve, os estrangeiros estarão trabalhado nas colheitas da maçã, do fumo e da uva. São setores em que a mão de obra também é escassa. Sem as alternativas de colocação no emprego, o risco é criar uma disputa entre brasileiros e imigrantes, o que já mostrou efeitos nefastos em outros países, como as escaladas de xenofobia na Europa.

A nova migração é um movimento recente, mas suficientemente forte para causar modificações econômicas, étnicas e culturais no interior gaúcho. EmEncantado, os 400 estrangeiros representam cerca de 2% dos 20 mil habitantes locais. O município já comemora, em maio, o Dia da Bandeira Haitiana.



SENEGALESES REZAM A MAOMÉ EM FÁBRICA DE MÓVEIS
O ritual se repete cinco vezes ao dia na fábrica de móveis Saccaro, em Caxias. Um por vez, os senegaleses se dirigem ao banheiro e começam a lavar mãos e pés, nas pias. É a purificação antes do encontro com os ensinamentos do Profeta, como chamam Maomé. Então, em fila, se ajoelham sobre um tapete verde (que eles chamam de “a July”) ornamentado com a figura de uma mesquita e começam a rezar. Baixinho, em wolof, principal idioma dos países da África Ocidental.

— Alahu Akbar (Alá seja Louvado)  — recitam, misturando o árabe ao dialeto senegalês.

Os murmúrios vão crescendo, deixando escorrer entre os dedos as contas da masbaha, equivalente muçulmano a um rosário católico. Pedem perdão pelos pecados, sob olhar curioso — e respeitoso — dos colegas brasileiros.

Mesmo os não fundamentalistas rezam cinco vezes ao dia. E respeitam o Ramadã, mês no qual só podem se alimentar à noite. No primeiro dia de agosto, quebraram o jejum com um farto “Almoço da Família”: carne de gado com batata e arroz, tudo apimentado.

Tirando a falta que sentem da família, os senegaleses são só elogios ao Brasil. Há recíproca.

— Eles têm muita facilidade para o trabalho, são honestos, disciplinados e não reclamam. Aprendem rápido, inclusive o idioma — diz a gerente de Relações Humanas da Saccaro, Ana Paula De Zorzi Caon. 

São 15 na fábrica, todos homens: dois costureiros, um contador, um pintor e os demais,
marceneiros. Yakhia Ba, o líder, costuma usar vestes tribais ou o fez (gorro muçulmano). Alguns faziam, no Senegal, faculdade na área de exatas, mas agora têm de lutar para sobreviver. Ganham bem, para o padrão africano. 

Modu Kurabu era comerciante em Dakar, com os pais. Nunca vendia o suficiente para sustentar mulher e dois filhos. Agora recebe R$ 1,3 mil, gasta R$ 500 e manda o resto para
casa. Vários nem conhecem os filhos: as mulheres estavam grávidas quando eles migraram
para o Brasil. Matam saudade via skype: todos têm computadores conectados à África.

 
Wakhou está há um ano e meio trabalhando na Saccaro
FOTO: DIEGO VARA

CARIBENHOS SÃO PROTEGIDOS POR IGREJA
Passaram-se quase 150 anos, mas a história, ainda que com distinções e peculiaridades, se repete. Em 1882, chegaram a Encantado, distante 149 quilômetros de Porto Alegre, os primeiros imigrantes italianos. Os descendentes desses viajantes formaram famílias, se
espalharam pelo território e, hoje, são absoluta maioria na cidade, com domínio sobre a cultura, a política e a economia.

A primeira criança gerada pelos italianos em Encantado foi Maria Bratti. Já falecida, ela é avó de Ivonete Teixeira, 61 anos, que hoje dedica sua vida ao Centro de Evangelização João Batista Scalabrini, ligado à Paróquia São Pedro, responsável por acolher as centenas de haitianos, dominicanos e senegaleses que desembarcaram na cidade nos últimos três anos, com frio, sem emprego ou lugar para dormir.

No vácuo do Estado, a Igreja assumiu a vanguarda solidária. A história da congregação scalabriniana, assim como a da família de Ivonete, traça um paralelo entre passado e presente. Era 1887 quando o padre italiano João Batista Scalabrini, preocupado com os viajantes do país que partiam rumo a outras regiões do mundo sem dinheiro, emprego e teto, além do desconhecimento da língua local, resolveu fundar a congregação com o objetivo de prestar caridade aos imigrantes.

No linguajar religioso, esse é o “carisma” da entidade. A congregação chegou a Encantado em abril de 1896, com a inauguração da Paróquia São Pedro, a primeira igreja scalabriniana do Rio Grande do Sul. E até hoje permanece atuante no município, sendo a única de Encantado. Depois de amparar os italianos, os scalabrinianos atravessaram mais
de cem anos de espera para acolher os imigrantes negros da África e da América Central. Um paralelo histórico que suscita temas como o racismo e a xenofobia.

— No início, tínhamos preocupação com a receptividade porque o italiano, em geral, é racista. Mas quase não tivemos problemas. Usamos o histórico a nosso favor. Dissemos que somos uma comunidade que nasceu da imigração. Por isso, entendemos que o mais justo
era receber bem esses novos imigrantes — conta Ivonete, voluntária scalabriniana.


Ivonete virou “mãe” dos imigrantes, a quem defendeu de discursos xenófobos
FOTO: DIEGO VARA

GANESES ACAMPAM EM SEMINÁRIO

Para quem ficou dormindo em banco duro de rodoviária, atordoado pelo ruído dos veículos, passando frio e fome, o seminário Nossa Senhora Aparecida, emCaxias do Sul, lembra um paraíso. O prédio em pedra, envolto por flores e pomares, abrigava até 10 dias atrás 90 ganeses que migraram para o Sul durante a Copa do Mundo, sem passagem de volta nem ingresso para os jogos. São parte de uma leva de 380 que escolheu a Serra gaúcha como ponto de partida na busca de emprego.

Permaneceram no Brasil 1.132 ganeses dos 2.529 que vieram com visto de turista para a Copa. Os primeiros conseguiram emprego rápido. Os retardatários aguardam ofertas. A rede de solidariedade católica garantiu a eles hospedagem em Caxias, comida e busca por colocação no mercado de trabalho. Daqueles 90, uns 20 são cristãos e os demais, muçulmanos. Passavam o dia atormentados pelo frio serrano, usando blusões recém-doados pelos fiéis da paróquia, sequiosos pelos raios de sol que iluminam o pátio interno do seminário. Lavavam as próprias roupas, cozinhavam basicamente, frango com arroz, muito condimentado — e comiam bergamotas nos intervalos. Dormiam junto ao refeitório, em colchões.

— São tão honestos e tímidos que tenho de insistir para que peguem frutas no pomar, façam
suco. Delimitamos um perímetro para usarem e eles não ultrapassam. E vêm com uma habilidade a mais em relação aos brasileiros: falam o idioma inglês — descreveu o administrador do seminário, padre Edmundo Marcon.

Em cadeiras dispostas em círculos ao ar livre, os ganeses recebiam lições de português de duas voluntárias, a estudante de Relações Internacionais Juliana Camelo e a publicitária Márcia Pessoa. As duas aproveitaram para praticar o inglês com os africanos.

— Também tomei conhecimento da culinária e da música deles. Muito legal, quero um intercâmbio para conhecer o país deles — entusiasmou-se Juliana.

Há semanas, emissários do frigorífico Nicolini, de Nova Araçá, vieram buscar 30 ganeses no seminário e perguntaram como fariam para levar os pertences dos migrantes. De imediato, todos embrulharam as roupas em sacolas e estavam prontos: possuem apenas algumas roupas, celulares e nada mais.

Mustafah Ibraim é um deles. Ex-jogador de futebol, sofreu um acidente de carro e ficou impossibilitado de jogar. Passou fome na procura por emprego em Gana. Decidiu migrar. Com ajuda dos pais, juntou dinheiro, voou até o Marrocos e veio parar em Caxias, viajando de cidade em cidade, acampando. Não tem dúvidas de que o Brasil “é o melhor país do mundo”.
Fonte: http://zh.clicrbs.com.br/rs/noticias/noticia/2014/08/novos-imigrantes-mudam-o-cenario-do-rio-grande-do-sul-4576728.html

quarta-feira, 6 de agosto de 2014




Novo espaço social da Cáritas destinado a comunidade é inaugurado em Londrina-PR



terça-feira, 5 de agosto de 2014

Bento Gonçalves fará mutirão para cadastrar imigrantes

Cerca de mil haitianos moram na cidade

 
Em setembro, será realizado um mutirão em Bento Gonçalves para incluir os imigrantes que moram na cidade no cadastro único. Com o cadastro, eles podem ser beneficiados por programas como o Bolsa Família e também atividades oferecidas pelo município. O mutirão ocorrerá no dia 27 de setembro, um sábado.

Conforme a integrante da Pastoral do Migrante da paróquia Santo Antônio, de Bento Gonçalves, irmã Ângela Soldera, há cerca de mil haitianos em Bento. Em número bem menor, também há senegaleses e imigrantes da República Dominicana. A pastoral oferece aulas de português duas vezes por semana para 70 haitianos que residem em Bento.

A data foi definida na manhã do último sábado (02) durante uma audiência pública promovida pela Justiça Federal de Bento.O encontro definiu ainda a necessidade de se criar um Comitê Municipal de Atenção ao Migrante.

Fonte: http://gaucha.clicrbs.com.br/rs/noticia-aberta/bento-goncalves-fara-mutirao-para-cadastrar-imigrantes-estrangeiros-111376.html