"O BEM VIVER NA MISSÃO COM OS MIGRANTES!"
BRASIL CASA DE DIFERENTES POVOS: NOSSA CASA Às Igrejas, aos Governos, à Sociedade Civil e às pessoas em situação de êxodo e vulnerabilidade
CONTEXTO DAS MIGRAÇÕES HOJE
“Hoje, o vasto fenômeno migratório constitui, cada vez mais, um importante componente da interdependência crescente entre Estados e Nações que concorrem para definir o evento da globalização; esta abriu os mercados, mas não as fronteiras. Derrubou os limites para a livre circulação da informação e dos capitais, mas não, na mesma medida, para a livre circulação das pessoas”. (EM. 4) No entanto, as migrações atuais constituem o maior movimento de pessoas de todos os tempos, envolvendo mais de duzentos milhões de seres humanos. Nestas últimas décadas, tal fenômeno transformou-se em realidade estrutural da sociedade contemporânea e constitui um problema cada vez mais complexo do ponto de vista social, cultural, político, religioso, econômico e pastoral; “milhões de pessoas migram, ou se veem forçadas a migrar dentro e fora de seus respectivos países; as causas são diversas e estão relacionadas com a situação econômica, as várias formas de violência, a pobreza e a falta de oportunidades para a pesquisa e o desenvolvimento profissional”.
(DA.73)
O COTIDIANO DOS MIGRANTES E SUAS CONSEQUÊNCIAS NEGATIVAS
Quantos irmãos e irmãs migrantes já não sofreram algum tipo de violência, de abandono e de exploração? E quantos já não sentiram medo, solidão, insegurança, rejeição e todo tipo da discriminação? Quantos não foram vítimas da propaganda enganosa, de exploração no trabalho ou violência sexual? Muitos são obrigados a permanecer no local de trabalho sem sair para o descanso, o lazer, para celebrar ou estudar, com o argumento de que devem pagar dívidas contraídas com viagens, alimentação ou aluguel... Outros sofrem ameaças e pressões por falta de regular documentação. Outros ainda sofrem o abuso de autoridades, agentes policias e profissionais corruptos, que se aproveitam da situação dos migrantes para cobranças ilegais. Quantas mulheres e crianças sofrem violências emocionais, físicas, sexuais e psicológicas dentro de seus próprios lares? Quantas crianças são vítimas de discriminação por não terem o acesso à educação e à saúde, pelo simples fatos de serem diferentes e por falarem outra língua? Muitos jovens procuram realizar seus sonhos por caminhos sem volta, nas drogas, no alcoolismo, no contrabando e na violência. Outros adoecem por excesso da jornada de trabalho ou por condições precárias. Quantos estão presos, longe da pátria, sem uma visita ou o consolo de um amigo? Quantas famílias se dividem e se desestruturam por falta de apoio e acompanhamento? Outros tantos devem fugir da violência das guerras para salvar suas vidas e deixando tudo para traz acabam como refugiados em acampamentos precários e sem as condições mínimas necessárias para viver om dignidade.
Quantas irmãs (os) com suas vidas atropeladas, obrigados a fugir de suas cidades, países e regiões, por causa dos fenômenos violentos da natureza (secas, vulcões, terremotos, tsunames, enchentes...). Quantos migrantes são explorados e escravizados no agronegócio, nas grandes obras e empresas em vista dos mega eventos. Quanta dor e sofrimento que carregam os retornados e deportados por causa das fronteiras militarizadas. Por causa da criminalização das migrações e a crise mundial, os quais se encontram em situação de depressão, de difícil reintegração social e de frustração em seus lugares de origem. Que triste ver a situação permanente de uma migração silenciosa e invisibilizada dos povos indígenas, donos desta terra, os quais longe de serem reconhecidos, são excluídos, reprimidos e empurrados mata adentro pela força irracional do capital e do sistema neoliberal. “Essa situação precária de tantos migrantes, que deveria provocar a solidariedade de todos, causa, ao contrário, temores e o medo de muitos, que olham os imigrantes como um peso, ou como suspeitos e os consideram uma ameaça, com frequentes manifestações de intolerância, de xenofobia e de racismo.” (DA. 377) Diante de tanta violência o Papa Francisco falou com muita firmeza: “Existe um juízo de Deus e também um juízo da historia sobre nossas ações ao qual não se pode fugir.” Basta de guerra e de violência de qualquer tipo. Vamos construir a Paz fundamentada na justiça.
AS DIFERENTES CULTURAS: UMA RIQUEZA PARA O NOSSO PAÍS, PARA A SOCIEDADE E PARA AS IGREJAS
As pessoas que migram, longe de serem problemas, são sobretudo um dom e uma oportunidade para o caminho da humanidade. Elas nos ajudam em nosso trabalho, nos obrigam a abrir a mente, as economias e nossas políticas. Essas pessoas nos estimulam a buscar novos modelos e a derrubar fronteiras. Elas nos revelam que todos somos filhos e filhas amadas de Deus. Somente juntos poderemos enfrentar este desafio e abrir nosso mundo ao um futuro diferente, onde que para o migrante “a pátria é a terra que lhe dá o pão”. (Scalabrini) Ao mesmo tempo quanta riqueza elas trazem ao nosso país e às comunidades com sua presença e cultura, com sua resistência e fé na possibilidade de um futuro diferente. Quanta beleza e profundidade contida nas suas simbologias, devoções religiosas e celebrações! Quanta contribuição sociocultural elas trazem através dos seus trabalhos e criatividade! Quanto os imigrantes colaboram com uma visão comunitária da vida, expressando gestos de solidariedade e sensibilidade! Neste sentido a migração humana é ocasião propícia para o diálogo e a acolhida. “Os migrantes são igualmente discípulos e missionários, chamados a ser uma nova semente de evangelização, a exemplo de tantos missionários que trouxeram a fé cristã à nossa América Latina”. (DA. 412) Tudo isso também podemos dizer e afirmar com relação aos brasileiros no exterior. Os migrantes são verdadeiros agentes político-sociais, protagonistas da historia e profetas da paz e da esperança, que denunciam um sistema injusto e anunciam um novo mundo. (Migrantes, Imigrantes, Refugiados, Apátridas, Temporários, Estudantes Internacionais...)
PAULO MIGRANTE POR VOCAÇÃO E EXEMPLO DE DISCÍPULO E MISSIONÁRIO NAS DIFERENTES CULTURAS E POVOS DO SEU TEMPO
Em comunhão com todas as Igrejas, colocamos como exemplo de discípulo e missionário o Apóstolo São Paulo, ele que soube trabalhar e se relacionar com as diferentes culturas e que soube dialogar com a riqueza dos povos propondo a Boa Notícia da salvação de Jesus. O Papa Bento XVI o qualificou como “migrante por vocação”. A Igreja nascente teve nos migrantes um importante impulso missionário propagador do Evangelho, neste contexto a figura de Paulo é para nós um exemplo singular e referência para os que se encontram em mobilidade. Este apóstolo sabia bem que só em Cristo a humanidade pode encontrar redenção e esperança. Por isso sentia como urgente e obrigatória a missão de anunciar “a promessa da vida que há em Cristo Jesus” (2 Tm, 1,1) “nossa esperança” (1 Tm, 1,1) para que todos os povos pudessem participar da mesma herança e ser “beneficiários da mesma promessa” no Cristo Jesus, “por meio do evangelho” (Ef 3,6).“Portanto, Deus que é amor, é quem conduz
a Igreja rumo às fronteiras da humanidade”. (DC.7) .A exemplo de Paulo, somos enviados ao encontro dos migrantes e a nos comprometer em tornar discípula missionária toda a comunidade, paróquia, diocese e a toda a Igreja.
A IGREJA SAMARITANA, MÃE E AMIGA NA CAMINHADA.
“A Igreja, como mãe, sente-se como uma Igreja sem fronteiras, Igreja familiar e peregrina como Povo de Deus em caminho, atenta ao fenômeno crescente da mobilidade humana em seus diversos setores. Considera indispensável a formação de uma mentalidade solidária e uma espiritualidade do serviço pastoral aos irmãos em situação de mobilidade, estabelecendo estruturas nacionais e diocesanas apropriadas, que facilitem o encontro dos migrantes com a Igreja local”. (DA. 412) O Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM quer assumir sua missão, unindo critérios e ações que favoreçam uma permanente atenção aos migrantes. “Faz-se necessário reforçar o diálogo e a cooperação entre as Igrejas de saída e de acolhida, a fim de dar uma atenção comunitária e pastoral aos que estão em situação de mobilidade; apoiando-os em sua religiosidade e valorizando suas expressões culturais e em tudo aquilo que se refira ao Evangelho. É necessário, que nos seminários e nas casas de formação se tomem consciência sobre a realidade da mobilidade humana, para dar a esse fenômeno uma resposta pastoral. Também se requer a preparação de leigos, agentes e lideranças que com o sentido cristão, profissionalismo e capacidade de compreensão possam acompanhar aqueles que chegam, como também às famílias que permanecem nos lugares de saída”(DA. 413). 3
SOMOS CAMINHANTES E RESPONSÁVEIS POR UM MUNDO NOVO, DIFERENTE, URGENTE E NECESSÁRIO: O MUNDO DO BEM VIVER
Fazemos também um apelo a toda a sociedade e ao Poder Público para o compromisso de criar políticas públicas e leis migratórias que garantam às pessoas em mobilidade a plena cidadania, conforme está na Constituição (Art. 05) que garante um tratamento igual a “todo Brasileiro e Estrangeiro residente” em nosso País e em base a Carta dos Direitos Humanos n° 13 da Organização das Nações Unidas–ONU- 1948. O Brasil sendo um País que nasceu, cresceu e se fortaleceu com a presença dos migrantes internos e de diferentes países, deve se colocar em sintonia com o Marco Jurídico Internacional dos Direitos Humanos e com as exigências da nova lei de Residência Regional do Mercosul. É tempo de diálogo com o diferente para fortalecer as relações interculturais e dar exemplo para o mundo que os tempos mudaram, e, que isto é possível com vontade política. Para este passo de qualidade é necessário assinar e ratificar a Convenção Internacional da Organização das Nações Unidas - ONU de 1990 que trata do cuidado com os direitos humanos dos migrantes e seus familiares. Neste sentido denunciamos todo tipo de violação aos direitos humanos das pessoas em mobilidade em nosso País. Expressamos nossa indignação pela situação de“desnacionalização de dezenas de milhares de dominicanos e dominicanas de ascendência estrangeira, em particular haitiana, estão sofrendo em consequência da Sentença 0168-13 emanada pelo Tribunal Constitucional da República Dominicana no dia 23 de Setembro de 2013”. Reconhecemos e agradecemos o trabalho da Pastoral do Migrante em seus regionais e setores, nas paróquias, comunidades, dioceses, congregações, organismos, entidades, associações e de forma especial à Família Scalabriniana, com seu carisma específico ao serviço entre os migrantes na Igreja. Conclamamos mais pessoas, agentes, profissionais e comunidades para somar forças ao serviço do migrante e das pessoas que sofrem. Façamos da Campanha da Fraternidade, Semana do Migrante (15 a 22/06/2014) e do Dia Internacional do Imigrante (18 de Dezembro) espaços de sensibilização e participação.
SONHANDO COM A CIDADANIA UNIVERSAL, JUNTO AOS MIGRANTES
A Migração revela um sistema injusto, com estruturas que concentram cada vez mais capitais e riquezas e excluem milhões de seres humanos obrigando-os a migrar para sobreviver e salvar suas vidas. Ao mesmo tempo anuncia um mundo novo sem violência aonde a justiça seja garantia de paz e de cidadania universal para todos. Não podemos esquecer as raízes migrantes, que construíram nossa Pátria. Somos migrantes neste mundo, e queremos construir a sociedade do Bem Viver no cuidado e na defesa da natureza e da cidadania plena, somando forças com os povos originários e tradicionais. Não podemos aceitar a exploração, o preconceito, o medo e a exclusão do migrante por causa de uma falsa mentalidade em que se confunde o migrante como uma mercadoria de lucro ou exploração e como um inimigo que coloca em risco a segurança ou que vem roubar nossas oportunidades de emprego. É um ser humano, um trabalhador, um protagonista e um profeta da esperança que está buscando como todos nós, um futuro de paz, de vida e dignidade. O gesto iluminador que nos orienta como pastoral e Igreja foi a visita e o encontro que o Papa Francisco teve com os migrantes e refugiados em Lampedusa – Itália: “Adão, aonde você está”? “Caim, onde está seu irmão”? São perguntas que mexem com a consciência e com a globalização da indiferença. “Peçamos ao Senhor a graça de chorar pela nossa indiferença, pela crueldade que reina no mundo, em nós, e também naqueles que tomam decisões sócio econômicas, que abrem estradas para dramas como estes. Peçamos perdão pela indiferença com tantos irmãos e irmãs; pelos acomodados, fechados em seus corações anestesiados; perdão por aqueles que, por causa das suas decisões, em nível mundial, criaram situações que se concluem com estes dramas” (Homilia do Papa Francisco – Julho/2013, Lampedusa – Itália). Diante da realidade de um êxodo forçado cada vez mais complexo, plural e massivo, convocamos a todas as pessoas de boa vontade a se unirem somando forças na causa pelo cuidado da vida e da natureza, sonhando com a sociedade do Bem Viver. Nossa Senhora de Guadalupe, Padroeira da América Latina, acompanhe a todos os seus filhos (as) que estão em situação de migração, para que juntos possamos construir o mundo sonhado pelo seu Filho Jesus.
São Paulo, 03 de novembro de 2013.
Participantes da 16ª Assembleia Nacional do Serviço Pastoral